A apanha da azeitona no Alentejo (1913)
A apanha da azeitona
No Alentejo, no celeiro de Portugal, procede-se atualmente à colheita de azeitona.
Os airosos ranchos de rapazes e raparigas que trajam saia-calção, com o infalível chapéu de feltro, ornado de flores naturais, em que predomina a simplicidade, sem faltar o bocadinho de preciso amor-próprio, e sem desprezo de todo o partido para a agradável estética de suas toilelles, atravessam, apressados, essas extensas estradas, orladas de frondosas oliveiras seculares para irem espalhar-se nos vastíssimos olivais que, por encostas suaves e planícies, se estendem ininterruptamente por milhares e milhares de hectómetros.
Ao findar o dia, voltam a casa bailando e a cantar alegremente ao compasso de enfeitada pandeireta, pela mais bela graciosamente tangida.
E o carreiro, à noite e sempre, com suas garbosas parelhas, conduz ao lagar a colheita do dia, para aí, onde a indústria moderna, em muitos, colocou já aperfeiçoados aparelhos, substituindo a vara pela pressão hidráulica, a candeia e o bispo pela iluminação elétrica, utilizando a força a vapor com que se fazem as interessantes operações em que dezenas de homens se empregam.
A árvore da paz, depois do varejo que se faz durante dias, fica aguardando que voltem as primaveras para se cobrir de flor e novamente dar esse fruto verdejante que pouco a pouco vai enegrecendo à medida que amadurece.
Da azeitona se faz o azeite
O fruto que se colheu entra nos lagares, alguns pelo sistema primitivo, como no tempo de Noé, lia-se há dias numa legenda de estampa curiosa, outras em prensas que são verdadeiras maravilhas e nas quais não se perde nada da azeitona.
Vai uma grande labuta no lagar.
Os lagareiros atentos à obra recebem os grandes cestos onde a azeitona vem enquanto a prensa vai espremendo a fruta de onde sairá o óleo abençoado que o homem, desde tempos imemoriais, aproveita.
O azeite foi a sua primeira luz artificial de duração posta nas estranhas lâmpadas encontradas ainda hoje nas cavernas, e foi o seu bálsamo, antes de ser o seu alimento e daí os grandes serviços que se deve à oliveira, árvore da paz que tanto floresce em Portugal, mas ainda assim sem dar a abundância larga de azeite necessário para e nosso consumo e exportação.
Oliveiras de norte a sul de Portugal
Por todo o país ela se cultiva, é tratada com esmeros, não se deixando ao abandono.
Não sendo propriamente uma árvore regional, há, todavia, terras onde ela existe em maior número e onde a qualidade do azeite é mais celebrada como em Castelo Branco, alguns pontos de Santarém – dos olivais da tradição, de Moura e Elvas, a terra das azeitonas mais saborosas de todo o Portugal.
É esta a época em se vai varejando a azeitona; alguma já entra no lagar onde se vai fabricando o azeite, uma das riquezas maiores do nosso país, assim como da vizinha Espanha, sendo a península que rivaliza com a Itália, a região dos belos olivais que o latino sempre amou enternecidamente.
E por esses campos fora, ao som das melopeias no Alentejo das alegres canções no norte, se vai fazendo a colheita da azeitona.
Fonte: “Ilustração Portuguesa”, nº 403 – 1903 (texto editado e adaptado) | Clichés do distinto amador sr. A. Abrantes, de Elvas