Trajos de Grândola e Trajos de Arronches | Trajos do Alentejo
Trajo de Grândola
O trajo dos pastores pouco difere dos demais trabalhadores rurais, que vivem nas casas de campo.
No entanto é neles mais frequente o uso
– dos botins (bota pelo meio da perna),
– polainas (a que noutro tempo ouvi chamar geralmente botinos),
– samarra (casaco de pele do ovelha, sem mangas e com uma pequena aba a proteger os úmeros),
– pelico de pele de ovelha e semelhante à samarra, mas talvez mais curto diante e com aba da parte de trás (o tapa-cu), para cobrir o espaço debaixo a descoberto pelo guarda-matos (nome vulgar dos safões), podendo a samarra e o pelico terem mangas ligadas por cordões ou correias.
Usam também os trabalhadores de enxada e os ganhões (assalariados com contrato por ano, que se empregam geralmente em trabalhos de culturas e de colheitas) umas metades de chapéu ligadas em volta dos tornozelos, caindo sobre os sapatos para evitar a entrada de terra nestes, a que dão o nome de enteparras (por entreparras ou enteparras, decerto) e semelhantes às polainas vulgares.
Apontamento do Dr. Manuel Matos
Trajo de Arronches
O alentejano da minha terra, ao contrário de que sucede em outras regiões de Portugal, não prescinde das ceroulas de pano cru e das meias grosseiras, de cores vivas, feitas em casa, por mãos de velhas nos serões de Inverno e nas tardes estivais.
Veste ordinariamente calça de casimira grosseira, que se ajusta inferiormente à perna e se chama por tal motivo calça de boca de sino. Por sobre a camisa ornada de colarinho mole, mas sem gravata, usa o colete quase sempre desabotoado.
Quando o tempo é quente a roupa de cima não vai além das peças já iniciadas, sucedendo usar-se às vezes a jaleca ao ombro. Quando o tempo, ao contrário, é frio, veste a sua jaqueta ou jaleca, talhada sempre curta e ajustando-se ao corpo de uma maneira apertada.
As golas de atracã, os vivos ou debrunas de fita preta, as alamares de prata – tudo isto hoje está em desuso já, e apenas se conhece de memória e de tradição. O calçado é quase sempre branco – botas e sapatos.
Só domingueiramente se usa o calçado engraxado. A bota alta de montar e a polaina empregam-se apenas quando as necessidades rústicas o exigem.
O chapéu usado é o chapéu braguês de aba comprida e larga, chapéu de enormes proporções, que antigamente possuía como ornamentos grandes borlas pretas, hoje desusadas também.
O tipo do capote alentejano é conhecido. Só com a gravura respetiva o poderia descreves competentemente.
Os safões ou ceifões de pele de chibo comprados nas feiras usam-se apenas quando as necessidades da vida agrícola aconselham a sua convivência.
Vestuário feminino
O tipo do vestuário feminino está-se incaracterizado também.
As saias de cima, quase sempre de cores vivas, têm comummente muita roda e usam-se sempre compridas.
A mulher da minha terra não sofre como a mulher de Nisa, põe exemplo, a moda da saia curta. As blusas ou roupinhas duma simplicidade extrema, ajustando-se ao corpo e deixando conjecturar toda a plástica do busto.
Quase sempre se usa o lenço na cabeça, ora atado com um nó sob o queixo ora atado com um nó também no alto da cabeça. Este lenço da cabeça e às vezes um lenço de malha próprio usam-se no busto, caindo em pontas sobre as costas e abrindo em decote sobre o peito. A mulher da minha terra nunca anda sem meias ou sem sapatos.
Xaile e mantilha
O xaile, grande xaile de merino, é peça de roupa indispensável. Pode usar-se dobrado em bico ou em ar de manta. Este último processo é considerado um processo fino de usar o xaile.
Hoje já não se veem mantilhas; muito raramente também se vê o bioco. Este é caracteristicamente regional, penso eu. É uma espécie de capa de um tecido preto, deixando cair à frente sobre a cabeça e o rosto um véu de tecido preto por igual e transparente.
Era dantes muito usado nos domingos e dias de festa. Foi peça de roupa imprescindível num bragal completo e trajava-se quando ia à missa.
Hoje, como o culto católico está muito em decadência, como quase ninguém vai à missa e as igrejas estão fechadas, o bioco só muito raramente se vê em mulheres de certa idade, que ainda se conservam fiéis ao cumprimento dos preceitos religiosos tradicionais com que foram criadas.
Extratos de um estudo acerca do trajo de Arronches, feito por Teófilo de Oliveira Júnior, estudante da Faculdade de Letras de Lisboa, datado de Julho de 1916
Fonte: “ETNOGRAFIA PORTUGUESA” – Livro III – José Leite de Vasconcelos (texto editado e adaptado) | Imagem (meramente ilustrativa): “Tipo do Alentejo” – Boletim Fotográfico – nº10 e 11 – Out e Nov de 1900