O prato ratinho | Como era antigamente
O prato ratinho
Ficaram conhecidos por ratinhos os beirões que, no passado, iam trabalhar para o sul, designadamente, para o Alentejo, em busca do trabalho que faltava na sua região de origem.
Reunidos em grupos segundo as necessidades, lá partiam de comboio rumo ao desconhecido para um tempo não completamente definido – uma invernada, diziam – que começava pelo tempo da apanha da azeitona e se prolongava pelos trabalhos do lagar e, eventualmente, das sementeiras e das ceifas.
Cada qual levava consigo travessa, bacia, prato, malga e colher, para as suas refeições que o patrão apenas disponibilizava caldeira ou panelão onde o grupo confecionava a própria comida, com os produtos disponibilizados para o efeito.
Naquele ano, o Catrino ganhou bom peso, comendo todos os dias, no seu prato ratinho, as couves dispensadas em abundância, bem regadas com o azeite nunca regateado. Só? – perguntámos. – Não que o resto era preciso comprar, esclareceu.
No regresso, quase sempre negociavam com os locais a loiça de faiança, sem marca do fabricante, grosseira, vidrada, das fábricas de Coimbra que por lá faltava, a troco de uns tostões ou de roupa para o corpo, mesmo usada, cobertas ou outros agasalhos.
O grande escritor José Régio, residindo em Portalegre, calcorreou o Alentejo em busca de crucifixos e de faiança ratinha para as suas coleções.
O exemplar que hoje divulgamos tem desenhos bem coloridos, simples, até ingénuos, ao gosto da gente humilde das nossas aldeias.
Fonte: A “Peça do Mês” do Museu de Silgueiros – Centro de Documentação Etnográfica
O Povo Ratinho
“O fenómeno das migrações sempre foi o reflexo da falta de trabalho nas terras de residência, e foi isso que levou a que elevado número de beirões, a pé ou de burro se metessem a caminho e nos vastos campos do Ribatejo e do Alentejo – e mesmo da Extremadura espanhola – procurassem a sua subsistência.
Era gente simples, necessariamente submissa, que não vergava face ao mais duro dos trabalhos, não obstante os miseráveis quartéis em que pernoitavam e à por vezes desumana alimentação. Trabalhar era o verbo que conjugavam sem hesitações. Poupar, um ponto de ordem de que não abdicavam.
Dizia uma senhora que morreu recentemente com 94 anos, que ao temperarem a comida o faziam com um gesto rápido de maneira a que caísse pouco tempero.
E contam-me agora que ao começarem mais tarde a fazer o caminho de comboio, a fim de pouparem no bilhete iam a pé até à próxima estação, e se apeavam antes de última
Há quem afirme que sempre foram bem recebidos onde quer que chegassem. Mas não seria bem assim, pois quer fossem ratinhos, gaibéus ou caramelos, era mão-de-obra mais barata que inclusivamente não permitia aos locais avançar com algumas reivindicações. Aliás, referem-no José Saramago em “Levantar-se do chão” e Alves Redol em “Gaibéus”.” Continuar a ler