Gastronomia

“A mesa do Zé” – Gastronomia tradicional de Montargil

As refeições ao longo da semana

Falámos com a senhora Celestina Trindade, que bem conheceu as casas pobres embora se pudesse considerar remediada, de lavrador, e que nos disse que poderia ser assim, pelo menos, e se fosse convidada, assim organizaria uma “semana gastronómica”:

Segunda-feira:
Almoço: Açorda com bacalhau
Jantar: Sopa miúda (com feijão verde e batata)

Terça-feira:
Almoço: Sopa de cação
Jantar: Feijão com couve e cação frito (de preferência no forno)

Quarta-feira:
Almoço: Migas gatas com bacalhau
Jantar: caldo verde com sardinha assada (de preferência no forno)

Quinta-feira:
Almoço: Sopa da panela, temperada com toucinho e chouriço
Jantar: O mesmo do almoço.

Sexta-feira:
Almoço: Sopa de cebola
Jantar: Feijão de molho com batatas

Sábado:
Almoço: Sopa de carne
Jantar: O mesmo do almoço

Domingo:
Almoço: Canja de galinha
Jantar: Galinha corada

Na mesa do Zé

Lembrando a doçaria, especialmente o arroz doce e o bolo de bacia, o bolo podre (com mel e azeite) e a torta de amêndoa, o bolo enrolado e a tigelada, o pão-de-ló e as broinhas, registemos também os licores de laranja, de tangerina, de limão e de erva-cidreira.

Entretanto, lembremos que a alimentação à base de “plástico” como se chama agora, sem frescos, sem fibras, sem frutas, é maléfica para a saúde em especial das gerações jovens.

Seria por isso importante “voltar aos hábitos mais sãos, a uma certa frugalidade”. A pressa do mundo e os horários de trabalho das pessoas, sabemos que é óbice a quem tem que cozinhar, mas há que fazer esforços para que todos tenhamos uma cozinha saudável.

E se hoje aqui trazemos um pouco da “nossa cozinha”, da cozinha que ia “à mesa do Zé”, fazemo-lo por razões culturais e de qualidade de vida.

Sabe-se que as pessoas mais pobres viviam com muita dificuldade, pois é verdade que nalgumas casas uma sardinha era para duas ou três pessoas, e muitas vezes se comia o pão de milho tendo o pão de trigo como conduto. Aliás, o meu pai nem queria ver o pão de milho à sua frente, visto que fora só o que comera até aos vinte anos.

No entanto, Castro Fernandes dizia que esta gente sempre foi auto abastecida. Viveu sempre da cortiça (os ricos, claro),e da agricultura, pois que embora havendo alguns latifúndios, muitos tinham a sua courela “onde semeavam batatas, feijão e grão e donde colhem fruta e azeite”.

Comia-se para viver

E não vamos aqui esquecer o pão caseiro, pois embora não saibamos da existência de qualquer “forno comunitário”, muitas casas tinham o seu, que ainda existem embora uns inactivos e um ou outro funcionando de vez em quanto.

Uma coisa é certa, ontem mais do que hoje, comia-se para viver. Era essa a preocupação daqueles que nos antecederam. E se recuarmos algumas décadas no tempo, vamos encontrar a hoje cozinha tradicional como uma verdadeira radiografia de uma terra, de uma região. Era certamente uma comida mais saudável, já que apenas se recorria a produtos naturais, à base de ingredientes da própria região.

Rica quanto ao seu conteúdo, a gastronomia de Montargil nas suas vertentes de culinária, bolaria e doçaria, sem esquecer alguns licores e mesmo o queijo, não pode perder-se. Trata-se de um património que importa utilizar (se devidamente recolhido e estudado) adaptando-se ainda quando disso for caso, aos tempos actuais.

Comecemos por registar alguns “pratos” que sabemos fornecidos por alguns restaurantes:

Sopa de cação | Migas de espargo com carne de porco | Brozulaque | Açorda alentejana | Gaspacho | Sopa de peixe | Borrego ensopado | Ensopado de cabrito | Sopa de pezinhos de porco |Migas de batata com lombo de porco e chouriço | Migas à alentejana | Sopa de carne | Entrecosto de porco,

e aos quais acrescentamos outros:

Migas de batata com carne, chouriço e toucinho frito | Sopa de cebola com bacalhau | Feijão de molho com batatas e ovos escalfados | Açorda com bacalhau | Feijão com couve | Canja de galinha | Papas de espeto.

Lino Mendes | Imagem de destaque