Cantigas à Desgarrada e Cantigas de Escárnio
Cantigas à Desgarrada
“Nas feiras, festas e arraiais, dois cantadores, ou cantador e cantadeira, divertiam os romeiros curiosos improvisando ou repetindo versos, ao som da concertina ou de simples gaita de boca. Se havia cantadeira, era dela a última estrofe.
Havia, pois, as cantigas improvisadas e as decoradas, geralmente do tipo pergunta e resposta.
Como é habitual na poesia popular, exprimiam-se em quadras de redondilha maior, mas transformadas em sextilhas divididas em dois grupos de três versos, com os seguintes esquemas:
1º b a b, b c d
2º a a b, b c d
Exemplo duma quadra com dois esquemas:
Boa noite, meus senhores,
Vamos então começar:
Diz-me lá, ó cantador,
Quantos peixes há no mar.
1º esquema
Vamos então começar:
Boa noite, meus senhores,
Vamos então começar.
(Pausa)
Vamos então começar:
Diz-me lá, ó cantador,
Quantos peixes há no mar
2º esquema
Boa noite, meus senhores,
Boa noite, meus senhores,
Vamos então começar.
(Pausa)
Vamos então começar:
Diz-me lá, ó cantador,
Quantos peixes há no mar.”
Para ler: Origem das regueifas e cantares ao desafio
Cantigas de Escárnio
“O povo português é profundamente poeta, quer quando canta, quer quando reza, quer ainda quando vasa a sua experiência milenária em máximas e provérbios.
Se bem que a sua inspiração esteja voltada fundamentalmente para o lirismo amoroso, como continuador da primitiva lírica trovadoresca das cantigas de amigo e cantigas de amor, não deixou, contudo, de cultivar também, embora em menor grau, a poesia satírica, na sequência lógica das cantigas de escárnio e maldizer.
Todavia esta sátira, humorística e moderada, nuns casos, irónica e mordaz, noutros, não se dirige a pessoas em particular, a não ser nas cantigas à desgarrada, entre cantador e cantadeira, mas a grupos de pessoas, as maiores dos quais são os dos homens e o das mulheres em geral.
É um fenómeno muito curioso a que poderíamos chamar de amigável guerra dos sexos, porque, como diz a sabedoria do povo, quem desdenha quer comprar.
É sobretudo deste tema que tratam as sátiras a seguir apresentadas.”
Aos Homens:
A folha do castanheiro
É bicada, com má renda.
Ninguém se fie nos homens,
Olhem que são de fraca tenda.
Fonte: “Literatura Popular de Trás-os-Montes e Alto Douro – II volume – Cancioneiro”, Joaquim Alves Ferreira | Imagem