Superstições e crendices

Crenças Sobrenaturais Saloias | Superstições e Crendices

Plantas medicinais

As bruxas, geralmente médiuns, na magia campesina representam por norma o lado psíquico e lunar da Natureza, enquanto as curandeiras, não raro «endireitas» dos ossos quebrantados e conhecedoras de plantas medicinais com que exerciam a sua medicina, agem assim como as antigas druidisas assinalando o lado espiritual e solar da Natureza.

Talvez por isto o exercício de «endireitar ossos» e da ervanária seja exercido maioritariamente por homens, pólo sexual positivo, activo ou solar, enquanto a actividade mediúnica cabe sobretudo a mulheres, pólo sexual negativo, passivo ou lunar.

Essa distinção entre mulheres de “bem” e de “mal”, recorda o episódio homérico da perda do sentido de sacralidade pelas vestais, sibilas e pitonisas ao ponto de se transformarem em simples adivinhas animistas, degredadas para fora das urbes por causa da sua influência nociva, o que se regista ainda hoje nas bruxas que vivem isolados e marginalizadas da restante sociedade, principalmente nos lugares rurais onde a magia campesina disputa as almas a par da religião de facto.

Sobre este tema aliciante, não deixo de aconselhar o interessante estudo de Amália Caetano, Medicina Popular na Região de Mafra, inserto no Boletim Cultural´94 publicado pela Câmara Municipal de Mafra.

Quanto aos exemplos que Maria Lila Costa dá da feitiçaria popular na Murteira, a verdade é que os mesmos acontecem também em todo o interior rural do Concelho de Loures, pois deparo com crenças idênticas em Bucelas, Lousa, Pinheiro, etc., para não falar nos de Odivelas, Sintra e Mafra.

Os lobisomens

Acreditava-se na existência de lobisomens, labisongos, meio-homens e meio-lobos que ficaram assim por serem munto pucadores, dando-lhes Deus como castigo transformarem-se em bestas demoníacas todas as meias-noites de Lua Cheia.

Os fantasmas, pantasmas ou búltemos, eram outra crença. Com eles só os médiuns ou “intermediários” podiam comunicar directamente. Como não podia deixar de ser, numa sociedade rural fechada, tais médiuns, geralmente mulheres, eram muito concorridos pelo povo local e dos subúrbios, assediando-os com os mais diversos tipos de pedidos que, se fossem satisfeitos, lograriam para tal médium a fama de «pessoa de virtude» e «uma santa», não importando que «a igreja não aceite, porque o padre não sabe senão as rezas escritas no Livro e que não me curaram dos males que a bruxa da vizinha me fez, mandando-me búltemos»

De passagem mas com importância maior do que se possa presumir, anoto que o exercício da mediunidade e a prática de todo e qualquer culto animista encontra pela frente a desaprovação total da Tradição Espiritual assumida por toda e qualquer corrente religiosa tradicional (seja católica, islâmica, judaica, hindu, etc.), mas o desenvolvimento deste tema não vem ao caso e, por conseguinte, prosseguirei o presente.

Rosa Lila refere ainda, para além das benzeduras e rezas utilizadas pelos endireitas dos ossos afectados e das más colheitas, havendo nisto, mais uma vez, certo sabor de nostalgia druídica, algumas regras de astrologia agrícola e mesmo cabalística.

Previsão do tempo

Por exemplo: os sintomas davam-se de 3 a 14 de Dezembro, quando os velhos, reparando no estado de tempo, prediziam que as condições meteorológicas de cada um dos doze dias corresponderia ao estado de tempo de cada mês do ano seguinte.

Também se acreditava na influência magnética das fases da Lua, agindo nos diversos aspectos da vida quotidiana; assim, toda a novidade hortícola deveria ser semeada sempre em quarto minguante, e as galinhas recolhidas sempre em quarto crescente.

Os números nonos, isto é, nunes ou ímpares, preferiam-se aos números pares: na quinta-feira da Ascensão guardavam-se, para dar sorte e ter pão todo o ano, 3, 5 ou 7 espigas de trigo.

Para o fabrico de chouriços, esperava-se que a carne estivesse de conserva 5, 7 ou 9 dias, para que ficasse bem cultivada e não se estragasse durante o ano.

Quando alguém tinha a espinhela caída, para se curar deveria estar deitado 3, 5, 7 ou 9 dias, conforme a gravidade da doença.

Em todas as benzeduras e rezas empregavam-se, como ingredientes de defumação, 3 ou 5 pedaços de certas plantas, sendo 3 as vezes que se repetia uma reza, em 3 (ou múltiplo de 3) dias sucessivos.

Outros costumes, fazendo parte das crenças sobrenaturais do saloio, sem dúvida supersticiosas desviadas e alteradas irremediavelmente de alguma tradição mais séria e menos absurda, mais espiritual e menos psíquica, e tomando por partida a Murteira, eram os seguintes: a partir do meio-dia não se devia deitar lixo nem água-vai para a rua.

Também não se devia levantar a mesa logo que terminassem as refeições, porque os “inginhos tem fome e quer comer”.

Para que o leite não secasse nas vacas, nunca se devia queimar, nas proximidades dos estábulos ou “palheiros”, onde elas viviam, madeira de figueira.

A figueira

Sobre o simbolismo da figueira, aproveito aqui este espaço para rectificar o seguinte. Ao contrário do que ouvi dizer acerca do fruto da figueira simbolizar o Pai Eterno por Este se manifestar súbita e misteriosamente tal qual a figueira que não dá flor e aparece o fruto sem que se espere, a verdade é que aparecem os bolbos a partir dos meados de Abril para que em JunhoJulho se colham os figos, que nos finais de Agosto já estão secos.

Foi assim que os vi nas muitas figueiras que varejei em minha infância, no Algarve junto dos pais da minha mãe adoptiva.

Portanto, essa interpretação do símbolo não está correcta, não se devendo esquecer que a figueira ou kurma, em árabe, ajustando-se ao tema hindustânico karma, “acção”, na cultura judaico-cristã ocidental estará para sempre associada ao episódio bíblico de Jesus ter amaldiçoado a figueira (Mateus, 21:19; Marcos, 2:12 s.).

Segundo é tradição geral, o simbolismo da figueira tem duplo interpretação: como árvore viçosa, repleta de frutos, simboliza a Ciência Sagrada cujos frutos são os preferidos dos seus postulantes; como árvore seca, morta, expressa a heresia e o mal representados pelos seus ramos dissecados, num dos quais Judas herege se terá enforcado.

De maneira que, associar o símbolo do figo ao Pai e esquecer que Jesus amaldiçoou essa árvore, vale o mesmo que o absurdo do Salvador tenha abjurado ao Progenitor da Criação…