Usos, costumes e tradições

A Quaresma, antigamente, em Loriga – Seia

A Quaresma em Loriga

A Quaresma em Loriga, foi sempre um período de verdadeira manifestação religiosa, de muita fé e muita devoção.

Mesmo hoje apesar de os tempos serem outros, continua a verificar-se o mesmo espírito religioso, tal como outrora. Continuam-se a realizar todos os actos litúrgicos, próprios desta quadra dolorosa da igreja católica que sempre se conheceu.

É certo também que, nos tempos passados, a quadra da Páscoa em Loriga era na realidade diferente, como podemos aqui testemunhar e ao mesmo tempo recordar. Recordamos pois aqui, o período da Quaresma em Loriga, nomeadamente as duas últimas semanas, onde podemos conjugar o passado e o presente.

Chegava a ser surpreendente a azáfama da população da Vila de Loriga, com a aproximação da quadra da Páscoa.

As pessoas uniam-se em comunidade limpando bem as ruas. As mulheres esforçavam-se numa barrela mais completa às suas casas, ornamentando as prateleiras com papéis coloridos e decorativos, onde os alumínios eram postos a brilhar.

As toalhas brancas eram colocadas nas mesas, pois tudo tinha que estar bem esmerado para quando da chegada do Senhor na Sua Visita Pascal, no Domingo de Páscoa.

Espiritualmente, o povo também se preparava, ninguém faltava à chamada “desobriga” até mesmos os menos praticantes não o deixavam de o fazer, toda agente queria cumprir com as suas obrigações para com o Senhor.

Nesses tempos a população era muita, por isso para as confissões, vinham sacerdotes das terras vizinhas ajudar o Pároco de Loriga. Por conseguinte as comunhões atingiam também números significativos e bastante elevados.

A Semana Santa

Durante a Semana Santa, nas proximidades dos fornos públicos da Vila, pairava sempre no ar o cheirinho aos bolos: broinhas; biscoitos; pão-de-Ló, bolo negro e outros, que eram as doçarias tradicionais feitas exclusivamente para essa altura.

Nos dias que antecediam o Domingo de Ramos, era quem mais procurava os melhores e maiores ramos, toda a gente queria ter o seu ramo para benzer nesse Domingo.

A concentração de toda a gente com os seus ramos era no Largo do Santo António, dali saía em cortejo para a Igreja Paroquial, alguns, mais pareciam autênticas oliveiras, que faziam com que o senhor padre ficasse com um certo mau humor, ao ver entrar na igreja tão grandes ramos.

Horas antes, grupos de jovens e mesmo homens, percorriam os seus ramos pelas ruas da povoação, cantando o “Rogai por Nós” e arreliando, por vezes, os mais desafortunados. Era um ritual tradicional de tempos passados que hoje fazem parte apenas de recordações.

No Domingo de Ramos, à noite, tinha lugar a Via-Sacra dos homens e jovens. Estes, transportando uma grande cruz de madeira, percorriam as principais ruas da Vila, recordando o caminho doloroso percorrido por Cristo a caminho do Calvário.

Esta manifestação era de muita devoção e de um verdadeiro sentimento de pesar, de silêncio e de muito sentido respeito, cerimónia a que nenhum homem queria de maneira alguma faltar. A Via-Sacra dos homens continua hoje a realizar-se.

A “amenta” das almas

No silêncio da noite rompem os cânticos de vários locais da vila, que mais parecem vozes com clamores vindo do Além lembrando ao povo para que reze pelas almas do purgatório e pelos familiares já desaparecidos da vida dos vivos.

Acorda, pecador, acorda do sono que está “dormente”. Lembra-te das benditas almas que estão no fogo ardente...”Durante o período da Quaresma, nas noites de sábado para domingo, homens e jovens cantavam a “Amenta das Almas“, tradição secular em Loriga, que ainda hoje continua a ser um ritual bem real.

Na Semana Santa as cruzes e os altares da igreja Matriz eram tapados, revestidos de preto ou roxo que só eram retirados na Missa de Sábado para Domingo, ao som das campainhas e sinos, simbolizando a Ressureição de Jesus.

Quinta-Feira Santa realizava-se a procissão do Senhor dos Passos pelas ruas da vila, tornava-se como sempre majestosa, algumas das vezes complementada com um sermão do “encontro” um ritual sempre muito aguardado com ansiedade e com certa fama na região.

No dia seguinte na noite Sexta-Feira Santa, era a vez de ter lugar a procissão do enterro de Jesus também pelas principais artérias de Loriga, e tal como a escuridão da noite o negro das capas da Irmandade era impressionante, incorporando-se todo o povo, com verdadeiro respeito, devoção e muito sentimento.

Domingo de Páscoa

Chegava finalmente o Domingo de Páscoa, que começava com toda agente a despertar mais cedo, pois não havia tempo a perder. As donas de casa apressavam o almoço e davam os últimos retoques nas respectivas casas. Era preparada e enfeitada a bandeja dos bolos.

Dos “guarda-loiças” eram retirados os melhores cálices e copos. Preparavam-se as garrafas do vinho abafado ou vinho do Porto já há muito tempo guardadas, especialmente, para esse dia. Ao meio-dia em ponto dobravam os sinos da Igreja anunciando a saída do Senhor Padre e da Cruz de Cristo para a sua visita Pascal.

Todas as portas eram bem abertas. Trocavam-se as visitas de familiares e amigos, era uma azáfama total. As pessoas iam a correr de um lado para outro, quando por vezes as visita Pascal condizia numa ou noutra casa ao mesmo tempo. Por norma a visita pascal era realizada por dois padres que percorriam toda a vila, um para o “cimo” outro para o “fundo”.

A Visita Pascal terminava já com o cair da noite, sendo bem patente nos rostos o cansaço. Ao mesmo tempo a satisfação do dever cumprido para com o Senhor e com as famílias. Mas, também e acima de tudo, sobressaía em todos, a Amizade, a Paz e a Fraternidade.

No dia seguinte as pessoas pareciam sentir já saudade desta quadra então agora terminada, pensando mesmo já no próximo ano para que voltasse bem depressa. Fonte(texto editado)