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O Folclore e o Meio Ambiente | Textos e opiniões

 

Desde sempre, o meio ambiente exerceu sobre a humanidade a mais decisiva influência, determinando as condições da sua fixação e moldando o seu carácter, factores que se reflectem nas suas formas de vida e na sua cultura, incluindo no seu próprio folclore.

Foi a possibilidade de cultivar solos mais férteis que levou a Homem a desenvolver as práticas agrícolas e, progressivamente, abandonar o nomadismo.

De igual modo, a procura de locais mais amenos onde a sobrevivência não é tão dificultada fê-lo descer às planícies e concentrar-se junto ao litoral e nas margens dos grandes rios, utilizando estes como vias de comunicação.

A natureza da paisagem reflecte-se no estado de alma dos indivíduos, transmitindo-lhes sentimentos de grandeza, alegria ou melancolia consoante a respectiva fisionomia.

De igual forma, também o estado do tempo influi no comportamento humano, condicionando não somente a sua actividade como as suas próprias reacções psíquicas pois, não é sem júbilo que vemos chegar os dias radiantes da Primavera e o desabrochar da natureza ou, ao invés, sem alguma angústia que observamos o aproximar dos dias soturnos do Inverno.

E, se o camponês passa a vida a observar atentamente o céu procurando adivinhar as variações do tempo, é o pescador que mais intensamente vive na dependência dos elementos meteorológicos – ainda que ambos vivam à mercê das condições meteorológicas, é sobretudo das condições do tempo que depende a segurança e a própria vida do homem do mar!

Sobre as chaminés das casas, nos campanários das igrejas e no capelo dos moinhos, os cata-ventos indicam-nos a direcção dos ventos e, o conhecimento adquirido por meio da observação constante dos fenómenos naturais, é oralmente transmitida de forma poética ao longo de sucessivas gerações.

E, por mais evoluída do ponto de vista técnico que a moderna meteorologia se apresente, com recursos a avançados processos de observação e registo por satélite, ela jamais dispensa o recurso à sabedoria popular e aos mais rudimentares instrumentos para medir a intensidade e a direcção do vento, ainda que lhe tenham adicionado componentes electrónicos para quantificar as medições efectuadas.

É a paisagem alegre e ridente do Minho, com o sol iluminando as viçosas e verdejantes veigas onde pastam os bois pachorrentos, a principal responsável pelo carácter jovial do minhoto, o qual transmite o seu modo de ser bastante peculiar através da exuberância das suas romarias, do colorido dos trajes, da música e da forma animada como cantam e ainda da graciosidade do seu artesanato.

E, à medida que nos afastamos do litoral, vai a paisagem adquirindo novas tonalidades de cor ao mesmo tempo que o traje e o carácter adquirem uma maior sobriedade.

E, do Minho sigamos para as agrestes serranias de Trás-os-Montes e da Beira Alta ou desçamos às melancólicas searas de trigo do Baixo Alentejo ou à vastidão da lezíria ribatejana e encontramos, uma vez mais, a comunhão perfeita entre o Homem e o meio que o rodeia.

Não admira, pois, que a paisagem, as plantas, os animais e o estado do tempo estejam sempre presentes no folclore uma vez que integram o meio que nos rodeia e constituem elementos essenciais à sobrevivência do Homem, sendo por esse facto fontes de inspiração no acto de louvar a Criador por meio dos talentos que Ele nos legou.

Procurar degradar ou mesmo destruir o nosso meio natural, para além do que tal representa em perda de qualidade de vida, equivale a fazer secar a fonte onde os poetas vão beber a sua sabedoria, o mesmo é dizer os temas do folclore que o povo cria.

Sem pretender contrariar a imparável marcha dos tempos, a preservação de formas de vida saudáveis que pressupõem o contacto com a natureza e a manutenção de costumes antigos não é incompatível com o progresso e a modernidade.

Antes pelo contrário, a evolução tecnológica e das relações sociais prenunciam já um futuro caracterizado pelo regresso às origens e às coisas simples da vida, sem o mesmo implicar necessariamente a renúncia aos bens e ao conforto produzidos pela sociedade moderna.

E, assim sendo, poderá o folclore vir a ser retirado das vitrinas do museu para onde foi remetido e tornar-se novamente um produto dinâmico da imaginação e criatividade do próprio povo!

Carlos Gomes, Jornalista, Licenciado em História