Fumeiro e enchidos que se comem na Beira Alta
Fumeiro e enchidos da Beira Alta
Na antiga província da Beira Alta, pode saborear-se algum fumeiro e enchidos que, embora não exclusivos daqui, possuem características que os diferenciam de outras regiões.
Alheira
Ainda hoje é conhecido por muitos como o «chouriço» dos judeus, pois por eles terá sido inventado, como artimanha para escaparem às malhas da Inquisição.
Como a sua religião os impedia de comer carne de porco, eram facilmente identificáveis pelos seus perseguidores pelo facto de não fazerem nem fumarem os habituais enchidos de porco.
Assim, substituíram a carne de porco por uma imensa variedade de carnes, que incluíam vitela, coelho, peru, pato, galinha e, por vezes, até perdiz, envolvidos por uma massa de pão que lhes conferia consistência.
A receita acabaria por se popularizar entre os cristãos – novos e velhos -, mas estes, claro, juntavam-lhe a omnipresente carne de porco.
Hoje, as mais afamadas são as de Mirandela, mas por toda a Beira Alta e Trás-os-Montes se fazem alheiras artesanais de excelente qualidade.
Geralmente são fritas em azeite e servidas com legumes cozidos e até batatas fritas.
Mas também podem ser estufadas depois de envolvidas em couve lombarda, embora no Sul do país este prato seja confecionado com salsichas frescas.
Bucho
A designação refere-se ao enchido típico da Beira Alta, já que em Trás-os-Montes se dá o nome de butelo à mesma preparação.
É composto por diversas carnes de porco, incluindo por vezes uma certa quantidade de ossos tenros, o que confere ao enchido um sabor muito especial. Pode incluir ainda arroz, ou pão, sendo o tempero essencial conseguido pela vinha-d’alhos.
Utiliza a tripa larga do porco. Se for fumado, pode ser consumido algum tempo depois da confeção.
Uma variante ao bucho, exclusiva da Beira Baixa, é o maranho, em que a matéria-prima já não é o porco, mas sim o cabrito ou o borrego.
As carnes são ligadas com arroz, juntando-se salpicão, presunto, toucinho, tudo temperado com alhos, cebola, vinho, azeite, salsa e hortelã.
Como não são fumados, os maranhos devem ser consumidos imediatamente após a confeção.
Bucho Raiano
O bucho é a peça mais peculiar do enchido raiano, a “peça gastronómica” mais genuína da raia sabugalense.
É preparada com pedaços de carne do porco dos ossos, cabeça, rabo e orelha, que, após colocada em vinha de alhos, dá enchimento à bexiga ou ao palaio do porco.
Depois de cheio, o bucho pendura-se com os demais enchido nos varais do fumeiro.
O Entrudo, em especial o Domingo Gordo, era e ainda é a ocasião propícia a comer o bucho, sendo da tradição que a família se reúna em convívio para o saborear.
Confeciona-se introduzindo-o numa larga panela de ferro, envolto em pano de linho, que evitará que rebente durante a fervedura.
Mantido em lume brando, o cozimento dura pelo menos três horas, após o que vai à mesa dentro de barranha de barro, ladeado por batatas cozidas e abundância de grelos de nabos.
Salpicão
Entre os enchidos nacionais, o salpicão é certamente o mais nobre. Pode ser elaborado segundo diversas variantes, tanto no modo de preparação como no tempero aplicado à carne de porco que constitui o enchimento da tripa.
No Norte do país usam-se grandes nacos do lombo do porco, temperados com colorau, alho, louro e vinho.
Em muitas zonas de Trás-os-Montes a carne fica mesmo durante algum tempo em vinha-d’alhos.
No Alentejo usa-se, por vezes, uma pasta de carne finamente picada e apaladada, sendo comum o recurso à casca de laranja para complementar os temperos habituais, a que não falta um bom sortimento de ervas aromáticas.
O tempo de fumeiro também varia consoante a região.
Em qualquer dos casos, podem ser consumidos crus, como aperitivos, assados ou incluídos no cozido e na feijoada.
Sendo o enchido nobre aquele em que se utilizam as melhores partes do porco, não admira que em muitas regiões seja o pitéu reservado para as grandes ocasiões.
Fonte: Guia Expresso O Melhor de Portugal, nº6 (texto editado, adaptado e aumentado) | Imagem