Alheira do Barroso – Enchidos de Trás-os-Montes
A alheira do Barroso
A sabedoria culinária adquirida pelas gentes de Trás-os-Montes ao longo dos séculos está bem patente neste produto regional: a alheira do Barroso.
Uma receita produzida com matérias-primas das Terras Altas do Barroso.
A lenda da alheira conta que a origem do peculiar enchido remonta ao século XV, quando os judeus foram expulsos de Espanha pelos Reis Católicos.
Alguns instalaram-se em várias zonas do interior de Portugal.
No nordeste transmontano também acabaram por ser forçados a converterem-se ao catolicismo.
Parece que a forma habilidosa que os recém-convertidos encontraram para iludirem os informadores da Inquisição e darem a aparência de consumirem porco – animal proibido nos costumes judaicos – foi inventar uma espécie de enchido feito com carne de aves, pão e gordura, semelhante a um chouriço e que seria a tal alheira.
Não há certezas em relação à veracidade desta história.
Nos escritos do Abade de Baçal – de sua graça Francisco Manuel Alves -, a alheira é referida como chouriço judeu, corroborando a ligação dos enchidos aos ‘novos cristãos‘.
A pretensa existência da ‘atabafeia‘, uma variedade de chouriço com miúdos de porco e galinha que se comia após ser enchido, tem reminiscências no reinado de D. João II (século XV), o que abre outra hipótese quanto à origem.
O porco na alimentação das populações
Não existem dúvidas é em relação à preponderância do porco na alimentação das populações locais.
Alimentado a castanhas e hortícolas da região para depois ser trabalhado na arte do fumeiro.
A simbologia do porco como economia de subsistência está contida em inúmeros descritores de cariz etnográfico publicados ao longo dos anos.
A raça bísara de pele malhada e dorso longo é conhecida pelas carnes magras, com pouco toucinho, mas entremeadas e saborosas.
A base das alheiras é a carne existente na cabeça (bochechas), e dos ossos da suã (vértebras) e outras aparas.
Mistura-se com outras carnes e são cozidas em água a sal, temperadas com alho, cebola, azeite, salsa, colorau doce e colorau picante.
O momento chave do processo é quando as fatias de pão com côdea são mergulhadas no caldo de cozer as carnes.
A mistura das carnes desfiadas, pão e condimentos é metida em tripas através de enchimento.
O resultado varia de acordo com o saber fazer de cada produtor.
Depois da fumagem com lenhas da região, a conservação das alheiras é feita através da cura em espaços secos e frios.
Atributos suficientes para que a alheira do Barroso fosse reconhecida em 2007 como Indicação Geográfica Protegida.
Longe vão os tempos em que o porco era citado no foral de Montalegre e servia como forma de pagamento…
Passaporte gastronómico
Nome: Alheira de Barroso – Montalegre IGP
País: Portugal
Morada: Distrito de Vila Real. Concelho de Montalegre: produção das alheiras. Concelhos de Boticas, Chaves de Montalegre (Terras do Barroso): produção das carnes.
Data de nascimento: Século XV
Particularidades: Enchido feito a partir de porco bísaro, galinha, peru, pato ou coelho, misturados com pão embebido na água de cozer as carnes e condimentos. É fumado sobre a combustão de lenha de carvalho e salgueiro durante 3 a 4 dias.
Texto de Fortunato da Câmara – Essencial/SOL | Imagem