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A Coca de Monção | Costumes e Tradições

A Coca de Monção – São Jorge contra o dragão

Nas margens do rio Minho onde as veigas verdejantes da Galiza se alcançam em duas braçadas, as gentes minhotas do concelho de Monção mantêm um velho costume que consiste em celebrar todos os anos, por ocasião dos festejos do Corpo de Deus, o lendário combate travado entre S. Jorge e o Dragão.

A luta tem lugar na Praça de Deu-La-Deu, cujo nome, consagrado na toponímia local, evoca a heroína que com astúcia conseguiu que as forças leonesas levantassem o cerco que impunham àquela praça.

Perante uma enorme assistência, a Coca – nome pelo qual é aqui designado o dragão! – procura, pesadamente e com grande estardalhaço, escapar à perseguição que lhe é movida por S. Jorge que, envolto numa longa capa vermelha e empunhando alternadamente a lança e a espada, acaba invariavelmente por vencer o temível dragão.

O dragão é representado por um boneco que se move com a ajuda de rodízios, conduzido a partir do exterior por dois homens e transportando no seu bojo outros dois que lhe comandam os movimentos da cabeça.

Depois de o guerreiro lhe arrancar os brincos que lhe retiram a força e o poder, a besta é vencida quando S. Jorge o conseguir ferir mortalmente introduzindo lhe a lança ou a espada na garganta. Neste momento, de uma bolsa alojada do seu interior, escorre uma tinta vermelha que simula o sangue da coca.

Esta tradição que representa a supremacia do Bem sobre o Mal encontra-se intimamente ligada às lutas travadas pela soberania nacional, sendo notória a utilização dos símbolos portugueses por parte de S. Jorge.

 

Festa da Coca em Monção

Culto introduzido pelos cruzados em Portugal

Com efeito, este culto foi introduzido no nosso país pelos cruzados que vieram combater nas hostes de D. Afonso Henriques nomeadamente a quando da tomada de Lisboa aos mouros.

A sua invocação em forma de grito de guerra começou contudo durante o reinado de D. Afonso IV e teve como objectivo demarcar-se da invocação de S. Tiago que era feita pelos exércitos leoneses.

Mas foi sobretudo a partir do reinado de D. João I que este culto veio a adquirir verdadeira dimensão nacional, passando a partir de então a sua imagem a integrar a procissão do Corpo de Deus. Ainda hoje, a sua simbologia é empregue nos meios castrenses, principalmente para representar o exército português.

O culto a S. Jorge que ainda se pratica em Portugal e cuja festa da coca que se realiza em Monção constitui um exemplo do seu cunho popular, possui as suas origens em antigas tradições da Síria, segundo as quais, S. Jorge foi um valente soldado da Palestina que, por ter confessado a sua fé cristã, veio a ser feito mártir.

Na Idade Média vieram a criar-se numerosas lendas à sua volta, uma das quais relata ter existido em Silene, cidade da Líbia, um terrível dragão ao qual o povo oferecia sacrifícios humanos.

Tendo em dada altura caído a sorte à filha única do rei, S. Jorge, que acabava de chegar àquela cidade na altura precisa em que a vítima ia ser imolada, prestou-se para a libertar, o que conseguiu. Uma vez derrotado o dragão, rei e povo converteram-se de imediato ao cristianismo.

A importância do folclore

O folclore não se resume à reconstituição das danças e cantares de um povo, do seu traje ou da exemplificação de alguns costumes ligados ao trabalho ou à festa. Ele constitui a história não escrita do povo e engloba toda a sua cultura não assinalada na sua história e na sua religião.

Por outras palavras, o folclore ocupa na história de um povo um papel semelhante ao que o costume, ou seja, a lei não escrita, ocupa em relação às leis codificadas.

De origem saxónica, o termo folclore teve o seu aparecimento pela primeira vez há século e meio e quer dizer a ciência ou o saber do povo.

Considerada como uma das variantes da Etnografia e frequentemente confundindo-se com esta, o folclore estuda especialmente as tradições populares isto é, o traje, as canções, as danças, as lendas, as superstições, os jogos, os adágios, as festas, a religião e até a medicina, nomeadamente a sua própria representação.

Estas fazem parte da identidade de um povo – são raízes de Portugal !

Carlos Gomes, Jornalista, Licenciado em História | Imagem